quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

B bar (intro#3)

Mas o primeiro a me falar no B. foi o Rafael, outro dos sócios de Armindo.

Uma certa noite de sexta para sábado, quando já passava da meia-noite e eu ficara de me encontrar no Bairro Alto com um grupo de amigos por volta das onze e meia, encontrando-me na Rua do Século, depois de ter conseguido estacionar à primeira no Jardim do Príncipe Real em troca de um euro pelo auxílio desnecessário de um moedinhas esquálido e com evidentes sinais de desequilíbrio neuro-químico, o Rafael disse-me, no seu bem conhecido e igualmente irritante tom de voz que mais parece uma montanha-russa de graves e agudos.

«Toninho... ainda bem que te encontro. Tenho um amigo que não duvido fazer o teu género.»

Conheço-o desde os tempos da faculdade, quando, vindos ambos da província, partilhámos o mesmo apartamento, depois de eu ter respondido ao anuncio que ele distribuíra pela cidade universitária, há mais de uma década. Sei que tem um fraquinho por mim, sendo que fraquinho é dizer pouco. Ou talvez o seu nítido interesse em mim seja apenas o facto de eu ter um dos poucos rabos de Lisboa que, apesar de o ter visto em diversas ocasiões, nunca lhe permiti provar, não porque seja desprovido de atributos físicos, antes pelo contrário, há que reconhecê-lo, com os seus ombros largos, ancas estreitas mas não demasiado e uns músculos firmes à flor da pele coberta por uma penugem perfeitamente distribuída, mas por causa do seu sorriso isento de calor que, desde o primeiro momento, me fez lembrar um dragão-de-komodo perseguindo a presa depois de lhe ter dado uma dentada aparentemente inofensiva. Como nunca lhe fui incorrecto no trato, nem mesmo quando me esquivava dos seus avanços abusivo, mas não se pode dizer que sejamos amigos porque apenas lhe falo quando nos cruzamos, talvez pense que um dia destes ainda lhe vou dar uma abébia e, portanto, não se me dirige como se fosse um antigo e ténue conhecimento. 

Com o braço encostado ao meu, acompanhou-me até a Rua da Academia das Ciências entroncar na do Século.

«Pois, não me serve para nada. Imagina só: o que podem dois activos fazer na cama; és capaz de me dizer? Mas é o número que tu calças, oh se é: corpulento, machão, uma pila daquelas, ui, medo, que pila, e se eu, que não gosto, até sou capaz de elogiar a pila do Armindo, já podes ver.»

Outro traço da personalidade de Rafael que me causa arrepios é, precisamente, a forma despudorada como faz inconfidências sobre as suas preferências sexuais, sobretudo perante estranhos, como já constatei mais de  uma vez. Desconfio que o faça para evitar embaraços talâmicos. 

«Gostava que lhe desses uma olhadela e, já agora que ninguém nos ouve, até que o fizesses feliz. Não anda com ninguém vai para quase um ano. Coitado! É só apareceres no B.»

«No B.?», disse, quebrando finalmente o meu silêncio.

«Não sabes?... Toninho, Toninho, mas onde é que tens andado? É um bar que abri com o Armindo e outros dois amigos. Fica perto do Finalmente.»

Depois de lhe ter dito que talvez passasse por lá, dependendo da vontade de uns amigos que tinha à espera no Bairro Alto, separa-mo-nos cada um para o seu lado; ele para a Rua da Academia das Ciências, e eu pela Rua do Século até começar a subir a João Pereira da Rosa, para ir ter com os meus amigos que me esperavam para mais uma noite de copo de plástico na mão numa justamente baptizada Travessa da Espera. 

Mas naquela noite acabei por não ir ao B.

«O quê? o B.? Estás parvo ou fazes-te? Aquilo é só velhas e grávidas...», disseram os meus amigos


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